Título de Cidadã de Estância

Título de Cidadã de Estância

Aracaju, tarde do dia 19 de março de  2006 

Solenidade: Câmara de Vereadores de Estância

Data: 20 de março de 2006

Palavras de: Margarida Cantarelli

Senhor Presidente da Câmara Municipal de Estância, Vereador Filadelfo Alexandre Silva Costa,

Senhor Prefeito da Cidade, Dr. Ivan dos Santos Leite,

Senhor Vereador Romualdo Vieira Santos,

Senhores Vereadores,

Senhor Procurador Geral do Estado, Dr. Edgar Silveira, representando o Governador João Alves,

Senhor Senador Albano Franco,

Senhor Desembargador Federal Geraldo Apoliano Dias,

Senhoras Juizas e Senhores Juizes Federais da Seção Judiciária de Sergipe,

Demais Autoridades presentes e já mencionadas,

Estudantes de Estância,

Senhoras, Senhores,

Difícil numa solenidade como esta dividir a palavra com o juiz, historiador e poeta, meu amigo Vladimir Carvalho. Estarei correndo o grande risco de ver um tema pobremente por mim tratado, apresentar-se recoberto de letras d’ouro na pena-lira deste vate sergipano. Peço que me perdoem, se me faltarem engenho e arte, pois só no Direito lanço a minha âncora e tenho o meu porto. Para contrapor-me, ponho humildemente o que de melhor posso lhes oferecer, todo um sentimento de amor por esta terra.

Retorno, Senhor Prefeito, alegremente a esta encantadora cidade de Estância, pois, como disse o escritor paraibano José Américo de Almeida, “ninguém se perde no caminho da volta, porque voltar é uma forma de renascer”. Nunca um pensamento foi tão adequado para descrever um momento vivido – eu voltei para renascer na cidadania estanciana que a magnanimidade dos senhores vereadores, acatando unanimemente a proposta do vereador Romualdo Vieira Santos, houve por bem conceder-me. Recebo com orgulho e a guardarei juntamente com a sergipana, ao lado da boa dose de sangue desta terra que corre em minhas veias, enriquecendo a minha história de vida profissional e pessoal.

Faz exatamente um ano – 4 de março de 2005, concluía o meu mandato como presidente do Tribunal Regional Federal da 5a Região, quando aqui estive para instalar a Vara Federal nesta cidade. Cumpria, assim, a lei que a criou e, acima de tudo, o meu compromisso com Sergipe, estado querido que me adotou como filha, e com a sua gente de quem me tornei irmã. Espero que ao longo deste ano, a presença da Justiça Federal, hoje tão bem conduzida pelo Juiz Ronivon Aragão, tenha trazido benefícios para os estancianos e munícipes vizinhos que ficaram sob esta jurisdição, permitindo-lhes exercitar um dos mais sagrados direito do cidadão que é o acesso à justiça, e recebendo, por intermédio dela, o que pela lei já lhes era devido.

Agora estou aqui para unir-me definitivamente a esta terra – e as minhas palavras são do mais sincero agradecimento. O diploma que simboliza o atestado da cidadania vale afetivamente como nosso próprio registro civil. Mais que a nacionalidade – que se dá por direito do solo ou do sangue, a cidadania outorga-se por direito do coração. É vínculo bem forte porque não decorre do acaso, nem da pura natureza, mas nasce da generosidade de quem concede e gera um compromisso para quem a recebe de sempre ser digno do prêmio que lhe foi conferido.

                       Se me perguntarem a partir de agora de onde eu sou – meu coração pulsará mais forte e na minha mente este momento passará como um retrospecto dentre os bons instantes por mim vividos. O carinho de Sergipe, de Estância, dos queridíssimos e incansáveis amigos que fazem a Justiça Federal neste Estado, das autoridades, na pessoa do Governador João Alves, do Senador Albano Franco, do empresário João Carlos Paes Mendonça, do Prefeito Ivan dos Santos Leite, dos Vereadores desta cidade e do próprio povo, são o oxigênio mais puro que pode receber a alma de quem acredita que servir é o maior compromisso do ser humano em relação ao seu próximo.

Quando eu voltar para o meu Recife, onde nasci e cresci, direi ao rio Capibaribe e ao Beberibe que eles já não são os únicos rios da minha vida. O Piauí e o Pauitinga também têm o seu lugar no encanto fluvial que me enternece; quando chegar na minha Olinda, onde vivo e sonho, direi que as suas Igrejas barrocas e os seus sobrados de azulejo bem portugueses, não são os únicos que os meus olhos apreciam. As Igrejas e os sobrados azuis e branco de Estância com seu ar colonial, também representam uma época de esplendor e das raízes da nossa cultura luso-brasileira; quando for à praia de Boa Viagem, no Recife ou de Casa Caiada, em Olinda, tão cheias de arranha-céus e formigando de gente, lembrar-me-ei do paraíso de beleza natural de Abaís, do Saco, de Pontal,  santuário das dunas e manguezais, num branco e verde que só o azul das águas é capaz de separar. Quando chegar na Faculdade de Direito do Recife – a “Casa de Tobias Barreto” como será sempre chamada, registrarei que também sou cidadã da terra do Ministro Heitor de Souza, que pontificou no Supremo Tribunal Federal e dá o nome a este Fórum; do Ministro Luís Carlos Fontes de Alencar, a quem devo grande gentileza de ter elevado a Revista do Tribunal, quando eu a dirigia, em repositório oficial de jurisprudência e de Gilberto Amado, todos três ex-alunos daquela Faculdade. Quando iniciar as minhas aulas de Direito Internacional ao ensinar sobre a formação do território brasileiro, não poderei esquecer de Gumercindo de Araújo Bessa e a grande querela sobre o Acre, onde se contrapunha com brilho ao também genial Ruy Barbosa; de tantos argumentos que caudalosamente apresentava, deu um contributo para além do jurídico, pois extraída da sua performance ao defender a causa, associando ao seu nome foi incorporada à língua portuguesa a expressão “à beça”, popularizada com o significado de grande quantidade, constante hoje do Dicionário Houaiss e já reconhecida também em Portugal. Não deixarei, como internacionalista, de ressaltar o trabalho do diplomata e jurista  Gilberto Amado na Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas, além da sua obra de grande expressão literária. E, ainda, sobre Gilberto Amado, não esquecerei de contar ao filho do grande poeta pernambucano Mauro Mota, que sou da mesma terra daquele a quem Mauro sucedeu na Academia Brasileira de Letras. Quando passar pelo Diário de Pernambuco, fundado em 1825 e ainda em circulação, falarei de um irmão mais novo, “O Recopilador Sergipense”, o primeiro jornal desta Província, fundado em 1832, pelo Monsenhor Fernandes da Silveira. Quando eu entrar no meu Gabinete de trabalho encontrarei a imagem de Nossa Senhora da Conceição, saída das mãos que modela o barro, na arte de Judite, a tudo presidindo e orientado-me no caminho da Justiça e do bem. Quando for ao México, nos próximos dias representando o nosso Brasil, ajoelhar-me-ei aos pés da Virgem de Guadalupe, não como um visitante qualquer dentre os milhares que lá acorrem, mas com a credencial de quem já se considera sua filha, posto que é Mãe e padroeira desta cidade.

Senhoras, senhores,

Dando azo à imaginação, se nesse momento fosse possível e aqui chegasse para uma nova visita D. Pedro II, surpreso perguntaria: o que faz uma simples margarida, entre os manacás em flor nos “jardins de Sergipe”! Se das flores não tem a beleza das rosas, nem o perfume dos jasmins! Certamente, senhor Imperador, diria alguém, veio humildemente colher o carinho dos amigos, fruto da generosidade de tantos, e levará só o “bem-me-quer” nas suas pétalas brancas  que contornam o amarelo dos pistilos, exalando um sentimento de gratidão e de compromisso com esta terra jardim que nunca deixará de servir e de amar.

Obrigada pela atenção e pela felicidade deste momento.


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