Dia das Comunidades Lusófonas

DIA DE PORTUGAL, DE CAMÕES E DAS COMUNIDADES PORTUGUESAS

ALMOÇO DO CAXANGÁ ÁGAPE

LOCAL: RESTAURANTE BOI PRETO

DATA: 10 DE JUNHO DE 2009.

PALAVRAS DE: MARGARIDA CANTARELLI

Senhor Presidente e demais agapeanos, Autoridades,

Ilustres convidados, membros da Comunidade Portuguesa no Recife,

Senhoras, Senhores,

O CAXANGÁ ÁGAPE, associação ímpar na história de trançar amizades no Recife, reúne-se há décadas (64 anos, precisamente) para celebrar, homenagear, reconhecer o mérito ou serviços prestados por pessoas ou Instituições à sociedade e a Pernambuco. Como sempre, em torno da mesa, para o ágape da confraternização.

Dentro do mais completo espírito agapeano, nada mais adequado do que celebrarmos juntos o Dia 10 de junho: Dia de Portugal, de Camões, das Comunidades Portuguesas. E assim, homenageamos a um só tempo, a todos os portugueses que escolheram o Recife como a extensão do seu berço natal e a nós próprios, como parte viva e ativa dessa grande união cultural, histórica e fraterna. 

                   Cabe-me, ainda, reconhecer e agradecer os serviços prestados pela comunidade portuguesa ao nosso Estado, tanto tomando algumas pessoas individualmente, que se destacam pelo seu empreendedorismo e dedicação a causas sociais, como através de todas as Instituições Portuguesas que se mantêm atuantes (algumas seculares – como o Real Hospital Português e o Gabinete Português de Leitura), notabilizando-se pelo esforço de fazer o melhor por esta terra que os tem como seus próprios filhos.

A cultura de um povo se percebe por muitas medidas, dentre tantas: pela sua História, pelas glórias do seu passado. Os grandes feitos dos descobrimentos, a presença nos quatro cantos do mundo (e se mais mundo houvera lá chegara!), levando também a fé Católica, marcaram a sua História. E nisso Portugal é muito rico! Pela representatividade da sua arquitetura, expressa em monumentos de grande valor artístico, do gótico manuelino às igrejas barrocas e até às arrojadas linhas modernas de um Siza Vieira. E nisso Portugal é muito rico! Por sua literatura, hoje é o Dia de Camões, mas também é o de Gil Vicente, de Almeida Garret, de Camilo Castelo Branco, de Eça de Queiroz, de Fernando Pessoa, de Miguel Torga, de Florbela Espanca, de Sophia de Mello Breyner Andersen, de José Saramago e de tantos e tantos outros. E nisso Portugal é muito rico

                     Mas, dentre as muitas e muitas facetas do caleidoscópio da cultura, também ela se mede pela gastronomia, pela arte de sua cozinha, pela criatividade ao proporcionar o prazer de comer bem. E nisso Portugal é muito rico!

E como estamos todos em torno da mesa, transformemos este espaço, com a força da nossa imaginação e o fervor dos nossos sentimentos, numa grande “Casa Portuguesa, com certeza”, onde ficam bem “o pão e vinho sobre a mesa”. Com os olhos dos sonhos, pairemos entre “quatro paredes caiadas” sentindo “um cheirinho a alecrim”. Coloquemos na mesa imaginária, que agora desejamos a todos oferecer, aquele “caldo verde, verdinho a fumegar na tigela”. Se preferirem, há também uma “Sopinha a Lavrador”, ou uma “Sopa de Pedra”, esta feita pelo legendário Cura, lá em Almeirim. Mas, o nosso ágape vai mais longe, recolherá o que de melhor houver pelos cantos, recantos e encantos daquela terra, para lhes trazer neste instante. Não nos limitaremos às dezenas e dezenas, ou centenas de formas de preparar-se um delicioso bacalhau: a Lagareiro, a Gomes de Sá, a Braz, a Zé do Pipo, a natas, as pataniscas, que lhes serviremos com batatas a murro ou, se preferirem, como eu, com arroz de tomate, que pomos a cozer em lume brando. Há um espaço destinado aos pescados, de todos os modos, e até com aquele delicioso molho escabeche; mas temos também uma “caldeirada de enguias da Ria de Aveiro”, ou para quem gosta, “arroz de Lampreia a Bordaleza”. O arroz de polvo, que foi arrematado em lota, bem cedinho, numa pesqueira à beira-mar, conserva o gosto de maresia! As sardinhas cheirosas já estão na brasa, preparando-se para os festejos de Santo Antônio e do São João. Temos também os “Rojões à moda do Minho”, mas não esquecemos o “arroz de cabidela” ou o à moda de Braga; nem as “morcelas” da Beira Alta; o “Bucho de porco” de Miranda do Corvo; “arroz de hortos”, os grelos, as nabiças, tudo servido com as “alheiras” de Mirandela; as “açordas” com muitos coentros e as “migas”, do Alentejo; o leitão da Mealhada e a “chanfana”, bem assada no vinho tinto, da Bairrada; as febras e a perna de porco à moda de Castelo Branco. Aguardem, ainda, que naquela mesa, à esquerda, do lado do coração, haverá um cozido à portuguesa e as tripas à moda do Porto; mas se desejarem algo bem forte, sirvam-se de “feijoca com orelheira”, muito ao gosto do nosso Imperador Pedro II. Há um prato especial que é o da minha preferência, um “arroz de pato à antiga”, com trinchos de presunto e de chouriço, que sabe ainda melhor.

Convém reservar um cantinho, na mesa dos sonhos, para as sobremesas. Podem saboreá-las à vontade, pois as imaginárias não engordam, nem têm colesterol! Ah! os Conventos, que imensa contribuição deram à doçaria portuguesa! Gilberto Freyre vem em nossa ajuda quando diz: “os doces das freiras foram um dos maiores encantos da velha civilização portuguesa, que antes aprendera com os mouros a fabricar açúcar e a fazer mel, doce e bolo”. E as marcas ficaram até nos nomes, pois estão ali sobre aquela linda toalha bordada na Ilha da Madeira: Pastéis de Santa Clara, Papos de Anjo, Orelhas de Abade, Barriga de Freira, Toucinho do Céu, Pudim do Abade Prisco, as meias-luas do Convento de São Tiago e as Clarinhas de São, recheadas de doce de chila! Nem preciso dizer que os pastéis de Belém saíram agorinha do forno das emoções, como os de Nata não poderiam faltar ao nosso desejo. Foram lembrados os filhoses, os ovos moles de Aveiro, as trouxas de ovos, o pudim de clara (não gosto que o chamem de Molotoff), a aletria, o arroz doce à moda de Condeixa, os “arrepiados de amêndoas” à alentejana; os “velhozes”; as “fugaças”, de Oliveira dos Azaméis; as “espigas doces”, de Montemor, o Velho. Vieram de Sintra as “queijadinhas” e os “travesseiros” e de Viana do Castelo, os doces do Natário, que delícia de folheados recheados com doce de ovos! Pensaram que esqueci as rabanadas? Nunca, as no leite e as bêbadas, no vinho, e que nós abrasileiramos com leite de coco! E no final da mesa imaginária, vocês encontrarão o “leite-creme”, com o açúcar bem queimadinho, um enorme e maravilhoso Pão-de-ló de Ovar e aquele queijo da Serra, servido a colheradas, com uma marmelada que só em pensamento poderia ser feita por mim!

Pois é, amigos, depois de tantas recordações que certamente os levaram a momentos da infância, a encontros de família que a memória do paladar conserva, não deixem que os sonhos se vão, pois, se agora ficamos apenas na imaginação, na realidade o que nós queremos e podemos lhes oferecer é o reconhecimento, o respeito e, especialmente, a nossa amizade. Que fique nessa “Casa Portuguesa” dos sonhos, na parede da fé que não se esvai, “o São José de Azulejo” nos abençoando, sempre!

Estamos à beira-mar, cheios de emoção, e apuremos o ouvido para perguntarmos, como nos versos de Florbela Espanca:

                            “Donde vem essa voz, ó mar amigo?…

        …Talvez a voz de Portugal antigo,

Chamando por Camões numa saudade!”.


Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *