Recebimento de título de Doutor Honoris Causa

FACULDADE OLINDENSE DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS E ADMINISTRATIVAS

RECEBIMENTO DE TITULO DE “DOUTOR HONORIS CAUSA”

DATA: 24 DE MAIO DE 2011. 

PALAVRAS DE: MARGARIDA CANTARELLI

Senhoras, Senhores,

Recebo com muita satisfação, honrada com o gesto generoso dos que compõem esta Faculdade, o título de DOUTOR HONORIS CAUSA. Na vida de uma professora que tem dedicado grande parte das suas atividades  ao magistério  – e é nesta condição que aqui estou, uma homenagem como esta vem ao encontro do sentimento do dever cumprido. Ser professor para mim é mais do que uma profissão é uma missão. Ser professor não é uma escolha, é um encontro, encontro consigo mesmo em razão do outro. Ser professor não é apenas transmitir conhecimentos, mas é construir com e para o aluno uma nova perspectiva de vida.

Agradeço penhoradamente pela escolha do meu nome para esta homenagem tão significativa e creio que para tanto pesaram a afetividade e as lembranças. Lembranças da década de 70 quando vi os sonhos de um contemporâneo da Faculdade de Direito do Recife – Biagio Chiappetta e o de um aluno da Universidade Católica, Abdon Moutinho de Andrade, serem  plantados como sementes férteis, nas terras históricas desta veneranda Olinda. E estes sonhos laborados com obstinação e dedicação plena de ambos, transformaram-se na realidade pujante do que hoje é a Faculdade Olindesne  de Ciências Contábeis e Administrativas – a FOCCA que já é bem mais abrangente do que o seu próprio nome expressa.

E vejo afetivamente os sonhos dos meus amigos sendo ampliados e conduzidos de modo competente  por suas filhas Antonieta e Ana Sílvia, que dão continuidade a sua obra, imbuídas do mesmo sentimento do professor missionário a que me referi. Alegra-me ver que esta Instituição cresceu passo a passo, ascendendo progressiva e continuamente com equilíbrio, adequação às demandas educacionais e vem dando uma remarcável contribuição à formação universitária em nosso Estado.

E dentre os seus cursos mais modernos está o de Direito, com a coordenação competente do mestre de todos nós, meu compadre e amigo – Prof. Palhares Moreira Reis. Sei também que tem um corpo docente de alto nível acadêmico e grande dedicação, e alunos desejosos de descobrir o empolgante mundo do Direito, dentre os quais incluo a minha nora Luciana.  

Esta Instituição nasceu sob as bênçãos do seu Patrono – Dom Frei Vital Maria, nascido Antonio Gonçalves de Oliveira Júnior. Dom Vital é um exemplo de que uma vida não se mede apenas pelo número de anos, mas pela intensidade das suas ações. Nascido em 27 de novembro de 1844, em Pedras de Fogo, então freguesia de Itambé, Pernambuco, morreu em Paris em 4 de julho de 1878, portanto com apenas 33 anos.

Aos 26 anos nomeado Bispo de Olinda,  foi um dos protagonistas da chamada “Questão Religiosa”, sendo preso, julgado e condenado. Desta complexa Questão,  destacarei apenas dois pontos. O primeiro, que desperta interesse dos que estudam a História do Direito, é o aspecto jurídico. O processo contra D. Vital foi instaurado a partir de um Recurso encaminhado ao Imperador, com fundamento no Decreto 1.911 de 28 de março de 1857, de Irmandade Religiosa do Recife inconformada com determinação do Bispo (D. Vital) que seguindo a orientação do Papa  (Pio IX) relativamente à Maçonaria, proibia a presença de maçons em tais instituições religiosas. Neste processo muitas perguntas ficam no ar: tal recurso era cabível? qual a natureza das Irmandades? Em matéria religiosa deviam subordinação ao Papa ou ao Imperador? Quais os poderes que a Constituição de 1824 dava ao Imperador sobre religião no Estado?

D. Vital, preso no Recife e transportado para o Rio de Janeiro, nada fez para se defender,  mesmo assim foi defendido pelo jurista católico Cândido Mendes de Almeida, cujo brilhantismo das suas palavras ainda  há  registros memoráveis.  

Julgado pelo Supremo Tribunal de Justiça, foi condenado por infração ao art. 96 do Código Criminal do Império do Brazil, Titulo II, dos Crimes contra o Livre Exercício dos Poderes Políticos, que dizia:

Art. 96. Obstar, ou impedir de qualquer maneira o effeito das determinações dos Poderes Moderador, e Executivo, que forem conformes á Constituição, e ás Leis. 

Penas – de prisão com trabalho por dous a seis annos. 

A sua pena foi de 4 anos com trabalhos forçados. E vem mais uma vez o questionamento jurídico: será que este tipo penal era aplicável ao caso concreto?

O segundo ponto deveria despertar interesse dos estudiosos da História. Em verdade, a História do Brasil tem um débito para com as mulheres, inclusive com aquelas que integravam a família imperial brasileira. E aproveito esta oportunidade em que uma mulher homenageia outra para juntas fazermos uma justiça histórica. Neste caso refiro-me expressamente à Princesa Isabel. Sendo ela profundamente católica, compreendia e apoiava a causa de D. Vital. Intercedeu junto ao seu Pai, o Imperador Pedro II, para que o anistiasse. Conseguiu, num primeiro momento, a comutação da pena para 4 anos de prisão simples (sem os trabalhos forçados). Quando D. Vital cumpria a pena  na Fortaleza de São João, na Urca, Rio de Janeiro, foi a Princesa Isabel pessoalmente visitá-lo. Com a sua ajuda, pode D. Vital chamar e levar os seminaristas de Olinda e do Recife, que já estavam prontos, para ordená-los ali mesmo. 

Mas, não parou por ai. Depois da queda do Gabinete do Visconde do Rio Branco, assumiu o Duque de Caxias, que pôs como condição para aceitar o cargo a concessão de anistia a D. Vital, no que contou com o apoio da Princesa Isabel, terminando D. Pedro II por anistiá-lo pelo Decreto 5.933 de 17 de dezembro de 1875.

Depois de libertado, novamente a Princesa Isabel auxilia D. Vital a viajar para Europa a fim de se encontrar com o Papa. 

Era preciso, num caso como este que exigia não só convicção, mas uma posição firme, fizéssemos nós justiça a esta senhora que se atuou destemidamente a favor do Bispo de Olinda, Patrono desta Instituição.

Senhora Diretora,

Não devo alongar-me. Renovando os meus mais sinceros agradecimentos por tão expressiva homenagem que ora me concedem, tenho a certeza de que esta Instituição, sob as benções do seu Patrono e inspiração dos seus fundadores, crescerá mais e mais, movida pela boa semente aqui plantada  e conduzida pela sensibilidade das suas dirigentes.

Muito obrigada a todos.


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