A Justiça Federal e o Direito do Estado: Políticas Internacionais

II CONGRESSO BRASILEIRO DE DIREITO E TEORIA DO ESTADO

FACULDADE DE DIREITO DE MONTES CLAROS – MINAS GERAIS

DATA: 21 DE SETEMBRO DE 2004

TEMA: A JUSTIÇA FEDERAL E O DIREITO DO ESTADO: POLÍTICAS INTERNACIONAIS

PALESTRANTE: MARGARIDA CANTARELLI

Distintos Professores, caros alunos,

Senhoras, senhores,

  1. Gostaria inicialmente de agradecer o convite, formulado pela Faculdade de Direito, através da minha querida amiga professora Kátia Wanessa, a quem não poderia faltar, para participar deste evento, nesta bela e acolhedora cidade de Montes Claros, que tenho a alegria de visitar (mesmo que  às carreiras).
  1. Quero, igualmente, cumprimentar os organizadores do Congresso pela oportunidade dos temas abordados, reconhecendo o esforço e a dedicação para tudo ocorra, da melhor forma.
  1. O tema que foi proposto é muito interessante para os estudantes de Direito, especialmente porque sei que ainda não está instalada uma Vara da Justiça Federal nesta importante cidade. Também na 5ªRegião, cujo Tribunal Regional Federal tenho a honra de presidir, o deslocamento das capitais, só agora começa a ocorrer. Para se ter uma idéia – do Ceará a Sergipe (6 Estados) apenas Campina Grande, Pb., e Petrolina, Pe, tinham varas federais, fora das capitais. Hoje – Limoeiro do Norte, Mossoró, Sousa, Caruaru e Itabaiana, já foram instaladas em 2004. E estamos preparando para o início de 2005 – Juazeiro do Norte, Caicó, Serra Talhada, Arapiraca e Estância, mais uma em Capina Grande e em Petrolina, destinadas aos juizados especiais federais. Tenho certeza de que em breve está cidade será dotada de uma Vara Federal.
  1. Vejamos: A Justiça Federal e o Direito do Estado: políticas internacionais.
  1. A Constituição do Império, 1824, estabeleceu um Poder Judicial – art.151 e seguintes (Título 6º, Capítulo único) – garantias da magistratura (relativas) / Primeira Instância e Tribunais das Relações (Apelações) – Supremo Tribunal de Justiça. Havia os juizes de paz

A Justiça no Império era NACIONAL – Estado era unitário

b) Proclamação da República dos Estados Unidos do Brasil –  forma de estado federativo – maior autonomia às Províncias e ao Poder Judicial (magistratura) em cada uma delas. O Decreto 25, 30/11/1889 tratava da independência da magistratura e o Decreto 510, de 22.06.1890, deixou explícita a importância da magistratura.

Com a República criou-se também a Justiça Federal. Como bem disse o idealizador do Estado Federal, Rui Barbosa:

“ Na dualidade constitucional da nossa organização constitucional, não pode haver senão duas idéias: a de uma justiça criada pelo Estado e a de uma justiça ligada à União: a justiça local e a justiça federal.À justiça local incumbe, como competência que lhe é nativa, o domínio das relações civis de caráter comum; à justiça federal pertence privativamente o domínio dos fatos e das relações de natureza política, daquelas que entendem com o regime constitucional, ou que tocam fundamentalmente às instituições constitucionais”. (Comentários à Const. Federal Brasileira, vol.IV,p.61).

– Antes mesmo da Const. 1891, o Decreto 848, de 11/10/1890, Campos   Sales, criava a Justiça Federal (dizia a Exposição de Motivos: “não se trata de tribunais ordinários de Justiça, com uma jurisdição pura e simplesmente restrita à aplicação das leis nas múltiplas relações de direito privado. A magistratura que agora se instala no país, graças ao regime republicano, não é um instrumento cego ou mero intérprete dos atos do poder legislativo. Antes de aplicar a lei cabe-lhe o direito de exame, podendo dar-lhe ou recusar-lhe sanção, se ela parecer conforme ou contrária à lei orgânica”.

  1. Como um parêntese: Justiça Federal do mundo: a partir da idéia norte-americana do Estado Federal, passou a existir em vários países que adotam tal forma de Estado (não em todos) e com conotações próprias.
  2. A Constituição de 1891 – artigos 55 e seguintes.
  3. A Constituição de 1934 – artigos 63 e seguintes
  4. A Justiça Federal foi extinta em 1937 – Decreto-lei 2.139 de 19/11/1937 – não consta da Constituição de 37 (a polaca), foi excluída dos dispositivos que tratam do poder judiciário.
  5. O que aconteceu: os juízes de Direito da Justiça dos Estados julgavam as ações envolvendo interesses da União (art. 108 CF 37).
  6. Com a Constituição de 1946 foi reimplantada a Justiça Federal com a criação de um Tribunal intermediário, entre os TJs e o Supremo – Tribunal Federal de Recursos, cujas atribuições estavam previstas no art. 104 da CF 46. – 9 Ministros; 1965 – 13; 1977 – 27 e teve sua competência ampliada. Foi tb. 1977 que TFR editou a sua primeira Súmula – a importância do TFR foi muito grande para a justiça brasileira.
  7. Reimplantação da Justiça Federal  de 1ª Instância – AI 2 (DOU 20/10/65) alterava a CF – art. 94, II previa TFR e juízes federais. Art. 104 recebeu um § 3º, onde se definia a competência dos juízes federais da primeira instância. A JF foi disciplinada pela Lei 5.010 de 30/5/66, que sofreu alterações, mas ainda hoje é a espinha dorsal da JF.
  8. A Constituição de 1967 a JF foi mantida no art. 107, II (EC 69 – art. 112, III) e sua competência reafirmada no art. 118 (EC 69 – art. 123). A reimplantação teve que ser gradual,não foi feita simultaneamente (competência a apenas 5 Juizes federais:SP,RJ,MG,DF,PE – RN 1969. Os primeiros magistrados foram nomeados Presidente da República e aprovação do Senado, servidores aproveitados.
  9. A Constituição de 1988 – extinto do TFR – criado o Superior Tribunal de Justiça e cinco Tribunais Regionais Federais. Os TRFs tinham sido previstos desde 1921, mas só frutificou a idéia modestamente em 46 com TFR. Coube ao TFR estabelecer as sedes, elaboração das listas tríplices dos juízes a serem promovidos e por Decreto de 22.03.1989, o então Presidente José Sarney fez as nomeações. Ficaram distribuídos: 1ª, 2ª, 3ª, 4ª e 5ª Regiões. A instalação do TRF da 5ª Região ocorreu em 30 de março de 1989 – comemoramos 15 anos.
  10. O último passo importante foi a criação dos Juizados Especiais Federais – Lei 10.256, 12/7/2001, mas sem criação de Varas, nem cargos de juiz nem de servidores. Só em novembro de 2003, com a aprovação da criação de novas Varas, ficou estabelecido que naquele ano a preferência de instalação seria para os Juizados Especiais. Assim fiz: 8 Varas. Atualmente com a interiorização – transformei o Juizado adjunto (juiz substituto) em J. Especial – Itabaiana, Caruaru (virtual), Mossoró. Já são “ virtuais” –Aracaju e Recife.
  11. Especialização da Varas (lavagem de dinheiro, previdenciária) e Turmas (criminal, tributário,previdenciário,etc.)

5. O Direito do Estado: a Justiça Federal está voltada integralmente (100%) para o Direito do Estado. Sempre uma das partes, em qualquer litígio será um órgão do poder público federal. Diferentemente da J. Estadual, do STJ e do STF que têm uma parte das ações envolvendo órgãos públicos (aplicando o direito do estado),na justiça Federal são TODOS.

Quem são eles: INSS – especialmente nos Juizados Especiais

                         CEF: Fundo de Garantia e SFH (conciliação)

                        União – AGU – servidores públicos, concursos públicos, etc.

                        Procuradoria da Fazenda Nacional – IPI, IR, PIS. COFINS, I importação,etc.

                       INCRA (desapropriação para fins de reforma agrária) , IBAMA (crimes contra o meio ambiente), DNER, CODEVASF, Universidades Federais, Escolas Técnicas Federais, entre outros órgãos de menor número de processos.

        MPF – Procuradoria da República – crimes da competência federal (responsabilidade prefeitos, repasse de verbas federais,por exemplo).

Ações Civis Públicas –

  1. Políticas Internacionais – a Justiça Federal é a que está, dentre as suas atribuições, voltadas para as questões internacionais ou de reflexos internacionais.
    1. tráfico internacional de drogas;
    2. imigração ilegal – clandestinos;
    3. tratados de direitos humanos;
    4. crimes a bordo de navios estrangeiros praticados nos portos, mar
    5. interpretação da zona econômica exclusiva

II – AS TRANSFORMAÇÕES DO MUNDO DESDE A SEGUNDA METADE DO SÉCULO  XX (o pós Segunda Guerra Mundial):

  • O Direito Internacional reflete as características da sociedade em que vigora: “a complexidade da nossa ciência reflete a complexidade da nossa sociedade” (B. Landheer).
  • A revolução tecnológica:  meios de comunicação e de  transportes;                                                conhecimento e informações.
  • Transformações  fora do Estado – a criação das Organizações Internacionais e os chamados “grandes espaços”.
  • Transformações dentro do Estado – o esgotamento do modelo pela necessidade de adequação da SOBERANIA.

III –  O ESTADO MODERNO, nascido no início do século XVII, sob a égide do princípio da  soberania clássica, apresenta, hoje, a sua SOBERANIA , caracterizada pela : interdependência e inter-relacionamento:

  • Interdependência (determinante autoritária circunstancial): restrição/contenção da vontade política – poder político nacional, pela incidência de outra vontade política/ poder político (estrangeiro, internacional ou supranacional).
  • Inter-relacionamento (determinante consensual) : restrições no espaço territorial / e nas relações jurídicas.
  • Hipóteses de não incidência do ordenamento jurídico nacional
  • Hipóteses de incidência de normas jurídicas produzidas (na sua origem) fora do Estado – a norma jurídica internacional.

IV – O DIREITO INTERNACIONAL E A COMPETÊNCIA DO JUDICIÁRIO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS: 

  • As Constituições brasileiras  (1891, 1934, 1937, 1946,1967 EC 1, de 1969).
  • A Constituição de 1988.

V – O DIREITO INTERNACIONAL E O PODER JUDICIÁRIO – TRIBUNAIS SUPERIORES E JUSTIÇA FEDERAL – CONSTITUIÇÃO DE 1988.

  • Litígios entre Estado Estrangeiro ou Organismo Internacional, de um lado, e:
  • a União – art. 102, I, “e” – originariamente do Supremo Tribunal Federal [Art.102, I, “e”: o litigío entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e a União, o Estado, o Distrito Federal ou o Território;]
  • os Estados – idem
  • o Distrito Federal – idem 
  • os Territórios – idem
  • os Municípios –  art. 109, II –Juízes  Federais [ art. 109, II – as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou residente no País] ; ATENÇÃO Recurso para o STJ:  art. 105, II, : julgar em recurso ordinário – “c”) as causas em que forem partes Estado estrangeiro ou organismo internacional, de um lado, e, do outro, Município ou pessoa residente ou domiciliada no País; 
  • as Pessoas domiciliadas ou residentes no país – idem supra
  • Observações: O Regimento Interno do TRF 5ª Região, diz no art. 8 º, II (às Turmas compete processar e julgar: II – […] salvo as causas em que forem partes o Estado estrangeiro ou organismo internacional, de um lado, e, do outro, Município ou pessoa residente ou domiciliada no País – CF, art. 105,II, “c”, em c/c o art. 109,II).
  • O Regimento Interno do STJ, estabelece: art.13, III – julgar as apelações e os agravos nas causas em que forem partes Estado estrangeiro ou organismos internacionais, de um lado, e, do outro, Município ou pessoa residente ou domiciliada no País; IV – julgar, em recurso especial,as causas decididas em única ou última instância pêlos Tribunais Regionais Federais[…] quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhe vigência.
  • Causas fundadas em tratados ou contrato  com Estado estrangeiro ou organismo internacional
  • União  – art. 109, III – Juizes Federais (III – as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estados estrangeiros ou organismos internacional); recurso art. 108, II – TRF ( julgar em grau de recurso, as causas decididas pêlos juízes federais e pêlos juízes estaduais no exercício da competência federal da área de sua jurisdição e pelos juízes estaduais no exercício da competência federal da área de sua jurisdição) ; recurso especial art.105, III, “a”(contrariar tratado).
  • Crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar – art. 109, IX
  • Crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro – art. 109, X c/c Estatuto do Estrangeiro Lei 6.815/80, Decreto 86.715/81 e Convenções relativas a Asilo.
  • Execução de carta rogatória,  – art. 109, X, 2ª parte, após o exequatur  que é concedido pelo STF, art. 102, I, “h”, e que, pelo Regimento Interno do Supremo, pode ser conferido pelo Presidente.
  • Execução de sentença estrangeira, art. 109, X,  3ª parte, após homologação do STF, art. 102, I, “h”, e que, pelo Regimento Interno do Supremo, pode ser conferida pelo Presidente.
  • Causas referentes à nacionalidade, respectiva opção e naturalização, art. 109, X, parte final.

VI – O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 

  • Além dos incisos “e” e “h”, do I, do art. 102 , mencionados,
  • Extradição: Art. 102, I, “g” – a Extradição solicitada por estado estrangeiro.
  • Recurso Extraordinário: Art. 102, III, “b”- declarar a inconstitucionalidade de tratado …

VII – O  TERRITÓRIO DO ESTADO

  • Natureza jurídica: território-competência (Kelsen,H.) – o território é considerado como uma porção da superfície terrestre em que se aplica, com efetividade de execução, um determinado sistema de normas jurídicas. O território é a esfera de competência espacial do Estado, o marco dentro do qual tem validade a ordem estatal.
  • Partes do território: 
  • território terrestre: solo, subsolo, ilhas e a plataforma continental;
  • território hídrico (água doce): lagos e rios  
  • território marítimo (água salgada): águas interiores, golfos, baías, mar territorial;
  • território marítimo com soberania específica: zona econômica exclusive e zona contígua;
  • espaço aéreo
  • território ficto: navios e aeronaves.
  • Território terrestre: soberania plena
  • Exemplos de exceções: imunidades ratione personae  (agentes de diplomáticos), casos de extraterritorialidade da jurisdição ratione materiae;
  • Territórios hídricos (águas doces): a soberania relativamente aos rios, deve levar em conta se é um rio nacional ou internacional
  • Rios internacionais – referência histórica:1648 Tratado Westfalia – navegação do Baixo Escalda; Ata Geral do Congresso de Viena, 1813,etc
  • Rios Internacionais – delimitação. Teorias: liberdade de navegação e igualdade de tratamento. Teoria do recurso natural compartido. Teoria da bacia de drenagem internacional.
  • Rios: navegação fluvial (Decreto Imperial 3.749, de 7 de dezembro de 1866, abrindo os Rios Amazonas, Tocantins, Tapajós, Madeira, Negro e São Francisco à navegação mercante internacional)
  • Território Marítimos (água salgada):
  • Águas interiores: linha de base (portos e ancaradouros)
  • Baías e Golfos
  • Mar Territorial: história, delimitação
  • Plataforma continental: plataforma geográfica – plataforma jurídica (divide-se em duas faixas: 1. coincidindo com o mar territorial, chama-se leito e subsolo do mar; 2. plataforma continental, após o mar territorial até o bordo exterior da margem continental ou até as 200 milhas.
  • Território marítimo com soberania específica:
  • Zona Econômica Exclusiva –  caso Tunamar
  • Zona Contígua
  • Espaço Aéreo
  • Território Ficto: navios e aeronaves

VIII – COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL

  • Extradição
  • MERCOSUL:
  •  Outros ramos do Direito: civil, comercial, administrativa (Protocolo de Las Leñas, de 1992, entrando em vigor 17 de março de 1996
  • Assistência Jurídica em matéria penal (Protocolo de San Luis, 25 de junho de 1996)
  • Protocolo de Ouro Preto de Medidas Cautelares (16/12/1994 – Dec. Legislativo 192/95)
  • Protocolo de Buenos Aires sobre jurisdição internacional em matéria contratual (entrou em vigor no Brasil e internacional 6 de junho de 1996)
  • Protocolo de Santa Maria sobre jurisdição em matéria de relações de consumo, 1996.
  • BRASIL / ESTADOS UNIDOS: Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América

IX – CASOS: JURISPRUDÊNCIA

  • STF – Apelação Cível – Questão de ordem. Relator: Ministro Moreira Alves, julgamento 6/9/89 Tribunal Pleno.
  • STF – Extradição n. 722-6 República francesa. Relator: Ministro Nelson Jobin
  • TRF 5 ª Região – Apelação Cível 203.008-PB – Relator: Juiz Castro Meira
  • TRF 5ª Região – Habeas Corpus  1097- PB – Relatora Juíza Margarida Cantarelli

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