Querida Marocas,
Já passa da meia noite, é 16 de março – dia do seu aniversário. Comecei a recordar que há exatamente dez anos comemoramos o nosso aniversário – Virgilio, 60, você 55 e eu os meus 50 anos. Foi uma festança aquele baile de carnaval na nossa casa da Alfredo de Medeiros. A tenda no quintal para as mesinhas, a orquestra tocando as músicas dos carnavais passados, dos carnavais que brincamos juntas no corso, no Internacional e no Português. A voz de Vera Costa não parava de cantar “quanto riso, ah quanta alegria”. Era o que nos rodeava. As danças no terraço, as minhas amigas todas com blusas iguais, o “bloco azul das margaridas”. Até os amigos franceses – Françoise (que também aniversariava) e Frédéric estavam fantasiados. Na sala, o bolo confeitado pelas Asfora, uma bela “máscara negra” com confetes e serpentinas. E tudo só acabou pela madrugada com um bom mungunzá.
E agora, Marocas, chegou a minha vez de completar os 60! Como vou comemorar sem você e Virgilio, que partiram cedo demais. Você gostava tanto do seu aniversário, suas amigas todas – Lourdinha Sarmento, Lúcia Otaviano, Edná Cavalcanti, Aurinha Brito, Simone Rodrigues e tantas e tantas que você cultivava com carinho, estavam sempre presentes porque também você nunca lhes faltava.
Como você me faz falta! Não só a mim, mas aos meninos também. Rafael e Anna guardam as mais lindas recordações, do seu amor, da sua dedicação, da sua presença contínua ao lado deles. Nós partilhamos o amor materno e eles sabem muito bem. Por isso não a esquecem e você é invocada a cada instante como referência de perfeição. Eu fico feliz, se é possível tirar felicidade da dor e da saudade, por ver o quanto você os marcou para o bem.
Você gostaria tanto de vê-los agora: Rafa – magro, estudando e namorando muito. Anninha, 4o ano de Direito, me ajudando nas coisas da casa, assumindo muito do que você fazia para mim. Todos dois são meus amigos e muito companheiros.
Também estaria muito feliz de me ver no Tribunal. Dr. Falcão e você acalentavam esse sonho, cochichavam, riam, muito antes de qualquer possibilidade de se tornar real.
Siqueira voltou, foi-se de novo. Como sempre e não se sabe até quando.
E agora, Marocas? Os amigos estão organizando um livro sobre minha vida. Como posso recordar as coisas se era você a minha própria memória. “Pituca, olhe isso; Pituca fale com sicrano; Pituca o aniversário de beltrano! Pituca você não pode gastar!”. Se não fosse você ao meu lado, como uma parte de mim mesma, certamente eu não teria conseguido fazer tantas coisas na vida.
Você dizia que não gostava de política, mas não arredava o pé de nenhum comitê, dando força e fazendo mil coisas o tempo todo. Era porque eu gostava, e se era assim, também lhe cabia uma parte.
É minha irmã, bem cedinho irei à Missa com Lúcia Helena e Nita, depois vou levar as flores todas brancas, como você gostava, para cobrir o seu túmulo, como você sempre fez para Papai e Mamãe, e onde já estão quatro de nós seis. Você, organizada na vida e na morte, preparou o lugar definitivo para todos.
Como será o meu aniversário sem você e Virgílio? Certamente terei o carinho da família e dos muitos amigos. Sei que você não deixaria passar em branco uma data assim. Eles também não vão deixar.
Entre nós ficou um vazio imenso, talvez as pessoas nem percebam o quanto isto me dói. Só peço a Deus que a levou tão cedo, que, pelo menos, a deixe sempre viva no meu coração.
Com carinho, sua
Guida