Histórias de viagens: avião 2

A Universidade Federal de Pernambuco, quando fui pró-reitora, integrava uma associação internacional de Universidades que se chamava Grupo Coimbra (numa homenagem aos 650 anos da velha Universidade portuguesa), que, sob o patrocínio da Comissão Européia,  desenvolvia diversas atividades acadêmicas e acompanhava projetos na área educacional em vários países da América Latina. Realizamos aqui no Recife muitos seminários, recebemos grande número de conferencistas na área do Direito Internacional.

Da mesma maneira, participávamos de eventos no exterior: Venezuela, Costa Rica, Argentina, entre outros. Foi quando, integrando uma comissão, coordenada pela representante do Grupo Coimbra, Cecília Costa, segui para a Patagônia Austral a fim de acompanhar o desenvolvimento de um projeto de educação a distância. A região sul da Argentina, com pequeno número de  estudantes aptos a ingressar em Universidade, além do clima um tanto inóspito, não permitia a manutenção de cursos superiores permanentes. Assim, uma parte do ensino superior se fazia através da Universidade de La Plata. O projeto estava sendo financiado pela Comissão Européia.

Saímos de Buenos Aires rumo a Rio Gallego, cidade que sediava o projeto. Com cerca de duas horas de voo, o avião parecia mais uma folha ao vento. Então, o comandante avisou que estávamos pousando na cidade de Comodoro Rivadávia porque o tempo tinha fechado no nosso destino e não poderíamos prosseguir naquela noite. Era preciso reabastecer para retornar a Buenos Aires.

As pessoas que têm medo como eu, ficam atentas a tudo. A minha amiga Cecília dormia tranquilamente. Quando pousou, eu a acordei, contei o sucedido e propus um “motim a bordo” para ficarmos naquela cidade e no dia seguinte prosseguirmos, afinal estávamos a uma hora do nosso destino. A minha sugestão foi aceita por ela, vários passageiros, e pelos integrantes de um conjunto musical brasileiro que também ia para Rio Gallego. Fomos para a cabine dizer que não admitíamos o retorno a Buenos Aires e exigíamos acomodações em hotel. Depois de muita confusão, bate boca, ameaças de lado a lado,  desembarcamos, mesmo sem as malas. Só prosseguimos às onze horas da manhã do dia seguinte quando o tempo permitiu.

Quando estava na Chefia do Gabinete do Ministério da Educação, recebi um prefeito do município goiano de Teresina de Goiás. Contou que lá existiam seis comunidades quilombolas conhecidas como Calungas e ele era o primeiro calunga a conseguir se eleger prefeito. Pedia que o MEC instalasse escolas nas comunidades e me convidou para conhecê-las. Inadvertidamente aceitei e marquei a data sem imaginar que aventura me esperava. Como a secretária de educação de Goiás iria conosco, não levei em conta a pergunta do Prefeito sobre os meios de transportes que eu usava. Fui para Goiânia e no dia seguinte pegamos um bimotor bem pequeno para o tal município.

O piloto, muito gentil, resolveu nos mostrar de perto alguns locais na rota – como a chapada onde despareceram uns estudantes. Dava uns rasantes de arrepiar a alma. Quase pousando, ele mandou o passageiro que estava na cadeira ao seu lado abrir a porta  para ajudar a frear  porque o campo era de futebol. Conseguiu parar já na marca do pênalti.

Essa viagem, cheia de tantas emoções, vai merecer um artigo especial, desde o barco que virou conosco no rio das Almas até a descida da serra  num cavalo.     


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